“Lovecraft Country” se passa nos Estados Unidos da década de 1950 e acompanha um jovem que acabou de voltar da Guerra da Coreia. Com seu tio e sua amiga, ele embarca em uma viagem em busca de seu pai, mas terá de enfrentar uma sociedade segregada e seres sobrenaturais.

Resistência e união

“Lovecraft Country” se mostra ousada mais uma vez por romper com a estrutura padrão das séries de TV. Ao invés de acompanharmos uma narrativa contínua por toda a temporada, a obra prova em seu terceiro episódio que o arco inicial foi resolvido no capítulo anterior. Entretanto, o que ocorreu anteriormente segue presente, seja como uma história secundária ou no reflexo da perda sofrida pelos personagens. Dessa forma, o que provavelmente veremos são arcos curtos, mas com elementos que os liguem para construir uma unidade.

Então, no episódio 3, o foco é em Leti e na casa que ela compra junto à irmã. Elas fazem do local uma pensão para negros. Mas, um detalhe, o local fica em um bairro de brancos e, como era de se esperar, eles não vão ser bem aceitos pelos vizinhos, que os hostilizam desde o primeiro dia.

Para sobreviver no local, eles se unem e resistem como podem, já que contra-atacar não é uma opção (a polícia é branca e defende os vizinhos). Entretanto, como acontece nos episódios anteriores, os conflitos aparecem em duas esferas: real (humanos) e fantástico (criaturas sobrenaturais). Se o primeiro se permite ser mais evidente, o segundo procura abordar o racismo de uma maneira mais sutil. Por sorte, ambos funcionam e a recorrente pergunta de obras do gênero retorna: quem é mais perigoso, os monstros ou o próprio ser humano?

Semelhante aos outros dois episódios, o racismo serve como ameaça inicial, enquanto o terror sobrenatural cresce nas sombras. Todavia, ambos se entrelaçam tematicamente. Aqui, a união pela resistência aparece na festa, quando todos na casa se unem para mostrar que não serão dominados pelos vizinhos. Mas ela volta a surgir no clímax, quando Leti dá as mãos aos espíritos a fim de expulsar o grande mal da casa. Não à toa, o episódio reforça muito o ato de dar as mãos.

lovecraft

O mais pé no chão

Porém, se a crítica explícita e implícita continua funcionando, assim como o desenvolvimento da relação entre os personagens, o mesmo não pode ser dito do terror aqui. Ainda que o desenvolvimento gradual da tensão e as boas pistas fornecidas pelo roteiro seguem presentes, a substituição do terror cósmico/mágico pelos espíritos e aparições não funciona tão bem.

A originalidade se perde em meio ao senso comum. Não que o terror não funcione, mas o episódio abusa de artifícios que já vimos um milhão de vezes antes. Luzes piscando, tabuleiro ouija, espírito atrás do personagem aparecendo no espelho, vozes malignas sussurradas e plot twist final com a câmera abandonando os personagens e mostrando uma revelação em uma narração mais irrestrita. Todos esses elementos estão aqui e enfraquecem um pouco o sobrenatural da série se compararmos aos episódios anteriores.

Portanto, o terror acaba se fazendo mais presente pelo subtexto do que por ser genuinamente aterrorizante. Mas, ainda que inferior aos dois primeiros, o terceiro episódio é mais um que funciona bem justamente por não ter medo de entregar muito em pouco tempo. Eu definitivamente nunca havia visto uma série começar com três episódios tão intensos. Dificilmente você encontrará algo melhor que essa série no momento.

Crítica em vídeo:

Assista abaixo à crítica em vídeo que eu fiz sobre o episódio em meu canal, o 16mm.

Assista ao trailer:

Ficha Técnica:

Título original: Lovecraft Country
Data de lançamento: 16 de agosto de 2020
Showrunner: Misha Green
Elenco: Jonathan Majors, Jurnee Smollett-Bell, Courtney B. Vance mais
Gêneros: Terror social
Nacionalidade: EUA